segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Bom dia! Aos Artistas Brasileiro

Música
Divulgação
Dolores Duran na década de 1950. Cantora foi uma das atrações no Beco
Dolores Duran na década de 1950. Cantora foi uma das atrações no Beco

Revista BRAVO! | Outubro/2008

Clássico do mês - Beco das Garrafas

Viela de Copacabana quer voltar a ser sinônimo

de boa música

Fábio Rodrigues

O lugar, um corredor aberto entre dois prédios na rua Duvivier, em Copacabana,
a poucos metros da famosa praia carioca, é mais simpático do que se costuma
imaginar. Na época em que o Beco das Garrafas construía sua mitologia, quatro
minúsculas boates dividiam o tal corredor. Três delas — Little Club, Bottle's e
Baccarat — se dedicavam à música ao vivo, prática comum no fim dos anos 50 e
início dos 60. A quarta oferecia moças a uma clientela bem diferente e foi
esquecida pela história.
Numa das boates, o Little Club, Dolores Duran cantou até morrer, em 1959,
diante do olhar apaixonado e platônico de um garçom. O garçom era Alberico
Campana, que, com o irmão Giovanni, arrendou duas das casas e viu o lugar
transformar-se primeiro em sinônimo de música instrumental, com feras como
Sergio Mendes, Luis Carlos Vinhas, Luiz Eça, Paulo Moura, Raul de Souza, Edson
Machado, Ed Maciel, J. T. Meirelles, Dom Salvador e Dom Um Romão. Depois,
em berço do pocket show à brasileira, inventado pela dupla Miele & Bôscoli,
e de cantores como Jorge Ben, Elis Regina, Nara Leão e Leny Andrade.
Já em meados da década de 1960, o Beco começou a decair. Os músicos foram
tocar nos EUA e até passaram a receber cachê, coisa que não fazia parte do
hábito local. Os cantores explodiram em programas de televisão ou palcos bem
maiores do que os tablados de dois por dois metros onde se espremiam entre
músicos e dançarinos. Até os produtores Ronaldo Bôscoli e Luís Carlos Miele
foram ganhar dinheiro em outra freguesia, cansados da falta de grana e do
excesso de precariedade. Miele lembra que, no Beco, a mesa de luz era uma
velha caixa de sapato "com quatro ou cinco interruptores" e os canhões de
luz eram lanternas, "daquelas com três pilhas". Para conseguir ver sentados
o show que dirigiam, ele e Bôscoli usavam um estratagema. Ligavam para a
boate e reservavam mesa, se passando por jornalistas famosos da época,
como Ibrahim Sued e Nina Chavs. Ocupavam o lugar, com as respectivas
namoradas, enquanto o figurão não chegavam.
Agora, depois de longo período às moscas, o Beco começa a renascer, com
Miele outra vez à frente, como diretor artístico. Três empresários —
Fernando Motta, Carlos Henrique Pollo e Sergio Martino — compraram
o espaço. O arquiteto e compositor Carlos Pingarrilho, autor de Astronauta,
entre outras músicas, cuida da obra. Ele uniu duas das três boates e criou
um espaço para 110 pessoas. No terceiro, com capacidade para 40 passageiros
sentados, vai funcionar um misto de museu e local para jam sessions. A data
da reinauguração é incerta. Provavelmente, no início do ano que vem, desde
que se arranje um patrocinador. Mas o público em vista é muito bem
definido, japoneses, europeus e norte-americanos, aquela gente que ainda
cultua a bossa nova e assemelhados e estranha enormemente que no
Rio de Janeiro, onde esse tipo de música nasceu, não haja um único lugar
dedicado a ele.

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